quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Comissão cita participação de médicos e PMs em torturas


Foto: O Globo
Documento traz nomes conhecidos como o de Paulo Magalhães e o do capitão que prendeu Dilma Rousseff
O O capitão do Exército Benoni de Arruda Albernaz é um dos nomes da lista elaborada pela Comissão da Verdade acusados de ter participado diretamente do trabalho sujo. Entre suas vítimas estava a então guerrilheira Dilma Rousseff, que décadas mais tarde se elegeria a primeira presidente mulher do Brasil.
Albernaz trabalhou no DOI-CODI do II Exército, em São Paulo, e, segundo a CNV, "teve participação em casos de tortura, execução, desaparecimento forçado e ocultação de cadáver". A ministra Eleonora Menicucci, da Secretaria de Políticas para as Mulheres, que na semana passada fez um discurso emocionado sobre as torturas que sofreu, aparece como vítima de três delegados: Aparecido Laertes Calandra, Dirceu Gravina e Lourival Gaeta. Todos trabalharam no DOI-CODI do II Exército.
Na lista de 258 nomes responsáveis diretamente pela tortura e mortes, estão 18 policiais militares responsáveis por execuções antes do golpe de 1964. Deles, 17 são PMs mineiros com participação no massacre de Ipatinga. A CNV relata que havia uma clima de tensão entre os operários da fábrica da Usiminas, insatisfeitos com as condições de trabalho. Em 7 de outubro de 1963, a Polícia Militar reprimiu o movimento atirando indiscriminadamente contra a multidão que se concentrava na entrada da fábrica. Apenas oito vítimas foram identificadas pela CNV, entre elas um bebê de três meses, mas números extra-oficiais apontam até 59 mortos. Os corpos foram ocultados e ninguém foi punido.
O outro caso anterior ao golpe é o do coronel João André Dias Paredes, que já comandou a PM do Paraná e morreu em 1987. A CNV relata que, quando ainda era tenente, em 1950, participou da execução de posseiros na repressão à Guerrilha de Porecatu (1947-52), no Norte do estado. A comissão identificou três vítimas da ação.
Uma figura comum na lista é a do médico-legista, que fraudava laudos para ocultar a causa da morte de presos torturados. Ao todo foram 47, entre eles Harry Shibata, diretor do Instituto Médico Legal (IML) do estado de São Paulo. Shibata e outros dois legistas vieram a ter seu registro profissional cassado depois. No caso de Shibata, diz a CNV, ele perdeu o registro "pela emissão de atestados de óbito e laudos necroscópicos fraudulentos".
Outros cinco médicos, embora não legistas, também foram citados. Deles, quatro eram militares, como por exemplo José Lino Coutinho da França Netto. Ele prestou serviço militar na unidade da Marinha da Ilha das Flores, na Baía de Guanabara, em 1969 e 1970, atuando como tenente-médico. Para a ilha, eram levados presos políticos.
"Teve participação em casos de tortura, acompanhando-a e colaborando com sua execução por meio da ocultação do delito, da promoção de tortura psicológica, buscando diminuir a resistência voluntária e a capacidade de decidir dos torturados e agindo junto aos presos políticos após as sessões de tortura física, já em suas celas, na tentativa de ganhar sua confiança e obter novas informações. Essas conclusões foram produzidas pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (Cremerj) e pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), em 1993 e 2000, respectivamente, em decisões que resultaram na cassação de seu registro profissional", diz o relatório da CNV.

Algozes famosos

Fora da cúpula militar, a CNV também listou nomes conhecidos, como o do coronel do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra, que comandou o DOI-CODI do II Exército entre setembro de 1970 e janeiro de 1974, período em que houve, pelo menos, 45 mortes e desaparecimentos forçados. Outro nome é do coronel do Exército Paulo Malhães, que morreu este ano. Ele atuou na Casa da Morte, em Petrópolis (RJ), centro clandestino para onde eram levados presos políticos para serem torturados e executados. O coronel Sebastião Curió Rodrigues de Moura, que teve atuação destacada na repressão à guerrilha do Araguaia e hoje dá nome ao município de Curionópolis (PA), também é listado.
O delegado da Polícia Civil paulista Sérgio Fernando Paranhos Fleury, morto em 1977, é outro nome da lista. Ele participou de casos de detenção ilegal, tortura, execução, desaparecimento forçado e ocultação de cadáver. O ex-delegado da Polícia Civil Romeu Tuma, que assumiria mais tarde o comando da Polícia Federal e se elegeria senador, também é citado: "Atuou no Departamento de Ordem Política e Social de São Paulo (DOPS/SP) de 1969 a 1982, período em que o órgão teve grande envolvimento com atividades de repressão política. Foi seu diretor de 1977 a 1982".

Bombardeio de napalm

A CNV citou até mesmo o caso de um general que, para reprimir atividade guerrilheira no Sul de São Paulo e Leste do Paraná, bombardeou a população quilombola e indígena local com napalm. Trata-se de Ernani Ayrosa da Silva, que ocupou vários cargos de comando no Exército.
Um dos casos listados é o de Ailton Guimarães Jorge, que serviu na 1ª Companhia de Polícia do Exército da Vila Militar do Rio de Janeiro de novembro de 1966 a março de 1972. Ele próprio teve vários problemas com a polícia, mas nada relacionado às atividades de repressão. Ailton saiu a Força em 1981, após ser condenado pela prática de contrabando. Foi preso ainda em 1993 e 2007 por envolvimento com o jogo do bicho.
O Globo

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