Por Leonardo Goy e Eduardo Simões
BRASÍLIA/SÃO PAULO
(Reuters) - A denúncia contra o presidente da Câmara dos Deputados,
Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e as crescentes especulações sobre a
permanência do vice-presidente Michel Temer à frente da articulação
política podem atrapalhar o governo da presidente Dilma Rousseff.
Apesar de, em tese, a denúncia do Ministério Público
Federal contra Cunha por corrupção e lavagem de dinheiro enfraquecer o
presidente da Câmara, observadores da cena política lembram que não é do
feitio do deputado amainar os ânimos após ser atingido e que, por isso,
a tendência é ele manter a temperatura elevada ou subir ainda mais o
tom.
"Acho que o apelido que ele carrega, de homem-bomba, é
cada vez mais atual. À medida em que se enfraquece, que é o que está em
curso, dentro da tática agressiva, ele pode tentar ativar mais algumas
pautas-bomba e teremos de administrar isso", disse o vice-líder do PT na
Câmara Henrique Fontana (RS).
Fontana é um dos parlamentares que, na quinta-feira,
defenderam o afastamento de Cunha da presidência da Câmara, logo após
ser formalizada a denúncia contra ele no Supremo Tribunal Federal (STF)
por suposto envolvimento nas irregularidades investigadas pela operação
Lava Jato.
Na mesma linha, uma fonte próxima à área de articulação
política do governo disse, sob condição de anonimato, que a denúncia
contra Cunha no STF pode tornar a situação do governo na Câmara mais
"conturbada". Segundo essa fonte, Cunha "age com o fígado" e costuma "se
defender atacando".
A percepção de que a denúncia contra Cunha não alivia a
vida do governo também existe do outro lado do Congresso Nacional, no
Senado.
"Claro que as denúncias contra o presidente da Câmara
vão criar mais dificuldades (para o governo), não tenha dúvidas disso",
disse à Reuters o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE).
Em nota divulgada após ser denunciado na quinta-feira, o
presidente da Câmara voltou a acusar o governo de atuar em conjunto com
o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para torná-lo o
primeiro político denunciado na Lava Jato, que apura uma esquema
bilionário de corrupção em estatais. Ele também disse estranhar que
nenhum membro do governo ou parlamentar petista tenha sido denunciado.
Nesta sexta, ao participar de evento da Força Sindical
em São Paulo, Cunha negou, entretanto, que fará qualquer retaliação por
conta da denúncia, mas adotou tom desafiador ao negar que renunciará ao
comando da Câmara.
IMPEACHMENT
A principal retaliação que Cunha pode realizar contra o
governo seria dar seguimento a um processo de impeachment contra a
presidente. Para Ricardo Ribeiro, analista político da MCM Consultores
Associados, no entanto, o parlamentar fluminense perdeu força para fazer
esse movimento após ser denunciado por corrupção.
"Perde legitimidade um processo de impeachment contra
Dilma com as digitais de Eduardo Cunha", avaliou o analista.
Para Ribeiro, no entanto, Cunha deve manter a
agressividade contra o governo, mesmo correndo agora o risco de
tornar-se réu em uma ação penal da Lava Jato. "A guerra que ele já tinha
com o governo, ele vai manter. Ele está em campo aberto de batalha",
disse.
TEMER CANSADO
Além das dificuldades que podem vir da Câmara, o
governo terá ainda de administrar nas próximas semanas as sinalizações
cada vez mais frequentes de que o vice-presidente da República, Michel
Temer, quer deixar as funções de principal articulador político do
governo.
Aliados e pessoas ligadas ao vice afirmam que uma
eventual saída dele da articulação não deve acontecer "por enquanto" e
que Temer não tomará medidas que provoquem o agravamento da crise.
Reconhecem, entretanto, que o vice tem encontrado obstáculos para
exercer suas funções e que tem "desabafado" sobre o assunto com pessoas
próximas.
"Falei com o Michel (Temer) ontem (quinta) umas duas
vezes, estive com ele antes de ontem (quarta). O que o Michel está
dizendo é que ele terminou um papel importante que ele tinha a fazer que
era a questão do ajuste fiscal", disse Eunício à Reuters.
"Ele enfrenta dificuldade no governo, coisas
internas... o problema é que ajusta as coisas e depois as coisas não
caminham, deve ter chateado", disse o líder, ressalvando que não recebeu
"absolutamente nada" do vice no sentido de que ele deixará a
articulação.
De acordo com a fonte próxima à articulação política do
governo, entre as dificuldades enfrentadas por Temer estão a
incompreensão que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tem do processo
político, o que atravanca a liberação de emendas parlamentares a
aliados, e a atuação do ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, que
tem, segundo essa fonte, represado a nomeação de cargos.
Uma fonte do PMDB na Câmara com conhecimento das
queixas de Temer, que também preside o PMDB, disse que o vice-presidente
de fato tem se dito "bastante cansado" com a tarefa e manifestou que
gostaria de atuar numa articulação "mais macro".
Na mesma linha, um senador petista afirmou que Temer,
por ser vice-presidente, "pode cuidar dos grandes temas e agir apenas em
questões pontuais quando for preciso".
Uma eventual saída de Temer da articulação criaria "um
estresse", segundo Ribeiro, da MCM, por sinalizar o afastamento do
governo de uma parcela importante do partido. Geraria ainda, segundo
ele, um aumento das especulações sobre a posição do vice em relação a um
eventual afastamento de Dilma.
(Reportagem de Maria Carolina Marcello, com reportagem adicional de Luciana Otoni em Brasília).
(Pararijos NEWS)